SÃO PAULO é sempre mais do que parece...

Pubblicato il 25-01-2014

di ARSENAL DA ESPERANÇA

O que é São Paulo pra você? Trânsito, superpopulação, favelas, rolezinhos? Centro financeiro, oportunidades de trabalho, universidades? Ou ainda entretenimento, teatro, shows, baladas? São Paulo pode ser um pouco de tudo isso e muito mais. Afinal, essa grande cidade sempre é mais do que parece...

O texto a seguir, gentilmente escrito para o nosso blog por Marília Bonas, historiadora e diretora do Museu da Imigração, faz uma viagem pela história de São Paulo – e, consequentemente, pela história do mundo todo. Embarque com a gente nessa viagem e descubra que, para resgatar a identidade dessa cidade e torná-la um lugar melhor, precisamos passar pela aceitação do diferente, do outro... Até porque, em São Paulo, “os outros” somos todos nós!

São Paulo, 460 anos

Diz-se que a cidade de São Paulo foi cosmopolita desde sua fundação, convencionada em 25 de janeiro de 1554 pela missa de constituição da missão jesuítica no Planalto de Piratininga. Podemos dizer que mesmo antes São Paulo era já um entroncamento de culturas, com indígenas de várias tribos, etnias e registros vagos de presença europeia de exploradores do Rio da Prata pra essas bandas. 

Nessa vida colonial, tupis, guarulhos, portugueses, espanhóis, religiosos, exploradores, líderes e membros de grupos viviam uma constante relação de espanto, negociação, troca e rejeição, absorção e exclusão cultural.

Séculos depois, a escravidão também trouxe, subjugadas, novas culturas, que em sua riqueza resistiram à coisificação de seus membros. Mas no final do século XIX, envergonhada desse caldo de cultura cozido acocorado em suas cozinhas de taipa-de-mão, a cidade de São Paulo derrubou sistematicamente os testemunhos materiais dessa vida para construir uma nova metrópole, de edifícios ecléticos e hábitos afrancesados. 

O café, origem de uma nova riqueza, antes plantado por escravos, passa a ser cultivado por europeus e asiáticos trazidos pelo governo num projeto político e ideológico. A essa cidade canteiro de obras, somam-se novas línguas e hábitos daqueles imigrantes que não foram para fazendas. Ofícios, estabelecimentos comerciais, casas operárias, imprensa – novos ares e frentes de trabalho pra uma nova metrópole. 

Mas os novos membros dessa sociedade não foram inicialmente tão bem aceitos quanto parece em seus primeiros anos: isolados, ainda que em grande número, “carcamanos” e “amarelos”, dentre outros, formaram núcleos de sociabilidade que não dialogavam com a São Paulo tradicional – que por sua vez, não reconhecia e não reconhece suas matrizes indígenas e africanas.

No entanto, diferentemente dos escravos alforriados e seus descendentes, muitos desses imigrantes tiveram ferramentas para prosperar e, na medida em que ascendiam economicamente, ampliavam seu círculo de relações e sua aceitação na cidade – imersa no desejo de se aproximar das cidades europeias. É nessa época, nas primeiras décadas do século XX, que São Paulo passa a se enxergar como metrópole, na riqueza e no conflito de muitas culturas em um mesmo território.

A chegada de estrangeiros em São Paulo nunca parou. No pós e entreguerras, refugiados de vários países se abrigaram nessa terra de oportunidades de trabalho, reunindo-se em bairros e introduzidos na vida paulista pelos membros de suas comunidades. 

Fadada a um grau de generosidade por seu caráter multicultural, a cidade absorveu influências de diversas nacionalidades em suas práticas e hábitos, tornando-se uma enorme e ímpar colcha de retalhos. E além da riqueza e beleza da diversidade, a tensão e o estranhamento, em diferentes escalas e contextos, nunca deixaram de existir. 

São Paulo recebe a cada dia um número expressivo de imigrantes e refugiados de diversos países da América do Sul, Central e da África. Tais fluxos imigratórios contemporâneos, com variadas razões de ser, dão novos rostos à cidade e suas dinâmicas trazem à tona a grande questão: como a cidade lida com o outro, ontem e hoje? 

Não há uma resposta única para tal pergunta. Acredito pessoalmente que São Paulo, na prática, é sempre mais do que parece. E nosso desafio como cidadão nesse território-palimpsesto*, historicamente diverso e contraditório, é criar uma cidade baseada na equidade, ou seja, na construção da semelhança pela diferença. Assim, enriquecida e empoderada verdadeiramente pelas múltiplas culturas, São Paulo, em seus (mais de) 460 anos de história, poderá ser mais justa e fraterna.


Marília Bonas, 24/01/2014

*palimpsesto: papiro ou pergaminho cujo texto primitivo foi raspado, para dar lugar a outro (Grande Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa).

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